quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

O Poeta

«O cavaleiro experimentou fazer a pergunta ao primeiro habitante que encontrou na Lua: a personagem retratada no arcano número um, O Mago, nome e imagem de significado controverso mas que aqui se pode entender - pelo cálamo que tem na mão como se escrevesse - por um poeta.
Nos brancos campos da Lua, Astolfo encontra o poeta, absorvido a interpolar no seu bastidor as rimas das oitavas, as filas dos enredos, as razões e desrazões. Se este habita mesmo no meio da Lua - ou é por ela habitado, sendo o seu núcleo mais profundo, - dir-nos-á se é verdade que ela contém o rimário universal das palavras e das coisas, se ela é o mundo pleno de sentido, o oposto da Terra insensata.
- Não, a Lua é um deserto - foi a resposta do poeta, a julgar pela última carta posta na mesa: a calva circunferência do Ás de Ouros, - desta esfera árida é que partem todo o discurso e todo o poema; e toda a viagem através de florestas batalhas tesouros banquetes e alcovas traz-nos de volta para aqui, para o centro de um horizonte vazio» 

Italo Calvino em O Castelo dos Destinos Cruzados (tradução de José Colaço Barreiros, teorema) 

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