quinta-feira, 7 de junho de 2012

sim... amanhã!

«Amanhã... oh! Se eu pudesse partir amanhã... renascer, ressuscitar! Preciso de demonstrar-lhes... que Paulina saiba que posso ainda ser um homem. Bastaria... aliás, agora, é muito tarde, mas amanhã... oh! Tenho um pressentimento e não pode ser de outro modo! Tenho agora quinze luízes de ouro e comecei com quinze florins! se se começa com cautela... será possível que eu seja uma criancinha? Será possível que eu não compreenda que sou um homem perdido? Sim! Bastaria, uma vez na vida, ser prudente, paciente e... eis tudo! Bastaria, uma só vez, ter carácter e, numa hora, podia mudar o meu destino. O essencial é o carácter. Basta que me lembre do que me aconteceu há sete meses em Roletemburgo , antes de me arruinar definitivamente. Oh! Foi um notável exemplo de resolução: tinha perdido tudo, tudo... Saio do casino, olho... um florim repousava ainda na algibeira do meu colete: «Ah! Ainda tenho com que jantar!», disse eu, mas depois de ter andado uns cem passos, mudei de opinião e voltei atrás. Pus esse florim no manque (dessa vez foi no manque) e, realmente, experimenta-se uma sensação especial quando, sozinho, num país estrangeiro, longe da pátria, dos amigos, não sabendo o que se vai comer nesse mesmo dia, se arrisca o último florim, o último, o último! Ganhei, e, vinte minutos mais tarde, saí do casino com cento e setenta florins no bolso. É um facto! Eis o que pode por vezes significar o último florim! E se me tivesse deixado ir abaixo, se não tivesse tido a coragem de me decidir?...
Amanhã, amanhã, tudo estará acabado!...»

Fiódor Dostoiévski em O Jogador (Guimarães Editores, tradução de Delfim de Brito)

Sem comentários:

Enviar um comentário