sábado, 1 de setembro de 2012

O Grande Croupier

«Não há pior escravidão do que a esperança de ser feliz. Deus promete-nos um vale de lágrimas na terra. Mas, afinal, esse sofrimento é passageiro. A vida eterna é a eterna felicidade. Rebeldes, insatisfeitos, respondemos a Deus: Não merecemos uma parcela de eternidade na nossa passagem pelo tempo? As trapaças de Deus são piores do que as de um croupier de Las Vegas. Promete-nos felicidade eterna e pranto na terra. Convencemo-nos que conhecer a vida e vivê-la bem é o supremo desafio a Deus no seu vale de lágrimas. Se ganhamos o desafio, seja como for, Deus vinga-se de nós: nega-nos a imortalidade à sua beira, condena-nos à dor eterna. Contra toda a lógica, atrevemo-nos a conferir lógica à Divindade. Pensamos: Deus não pode ser o criador da miséria e do sofrimento, da crueldade e da barbárie humana. De qualquer maneira, isto não foi criado por um Deus bom mas por um Deus mau, por um Deus fingidor, por um Deus mascarado que só podemos vencer esgotando as armas do mal que Ele próprio criou. Sexo, crime e, sobretudo, a imaginação do mal. Não são estas, também, dádivas de um Deus maligno? Convencemo-nos, assim, que só assassinando o Deus usurpador conseguiremos, limpos de corpo, livres de mente, ver o rosto do Deus primordial, o Bom Deus. Mas o Grande Croupier tem outro ás metido na manga. Tendo esgotado o corpo e a alma para chegar até ele, Deus revela-nos que Ele não é senão o que Não É. Apenas podemos saber de Deus aquilo que Deus não é. Nem os Santos nem os Místicos nem os Doutores da Igreja sabem o que Deus é; nem o sabe o próprio Deus, que cairia fulminado pela sua própria inteligência se o soubesse.»

Carlos Fuentes em Diana ou a Caçadora Solitária (tradução de Maria do Carmo Abreu, Editora Planeta DeAgostini)

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