terça-feira, 15 de outubro de 2013

As coisas deste mundo

«Como as coisas deste mundo são de natureza transitória e mortal, é evidente que todas, em si próprias e fora de si próprias, são geradoras de aborrecimentos, de angústias ou de cansaço e sujeitas a perigos infinitos. De onde se conclui que nós, que vivemos envolvidos nelas e delas fazemos parte integrante, não saberíamos manter durante muito tempo a nossa salvação, se Deus, por uma graça especial, nos não concedesse a força e a inteligência. Uma verdade, porém, se impõe. Deus não fez descer sobre nós estas virtudes para compensar um só dos nossos méritos: elas são produto da sua bondade e obtemo-las também através das orações daqueles que outrora, mortais como nós e dóceis à vontade suprema, encontraram agora, na sua companhia, a vida eterna e a felicidade. A esses privilegiados, a quem a experiência ensinou a fraqueza, encarregamos, como a procuradores, de velarem por aquilo que é, julgamo-lo, de nosso interesse, e nós próprios lhes dirigimos orações que o receio nos não permite elevar até ao Juiz Supremo.»

Boccaccio em Decameron (tradução de Urbano Tavares Rodrigues, Relógio d'Água)

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