«No dia sufocante do casamento, na estreita igreja de Saint-Clair, onde o falatório das damas cobria o pequeno órgão sem fôlego e os seus odores triunfaram do incenso, foi nesse dia que Teresa se sentiu perdida. Entrara sonâmbula no cárcere e, de repente, ao fragor da pesada porta que se fechara, a miserável criança tinha acordado. Nada mudara, mas ela tinha o sentimento de não poder, doravante, perder-se sozinha. No fundo espesso de uma família, ela ia viver surdamente, semelhante a um fogo invisível que rasteja sob o mato, incendeia um pinheiro, depois outro, e pouco a pouco vai criando uma floresta de archotes. Naquela multidão, nenhum rosto em que repousar os olhos, a não ser o de Ana; mas a alegria infantil da rapariga isolava-a de Teresa. A sua alegria! Como se ela ignorasse que iam ser separadas nessa mesma noite, e não só no espaço, mas também por causa do que Teresa estava prestes a sofrer - daquilo que o seu corpo inocente ia sofrer de irremediável. Ana ficava na margem onde aguardam os seres intactos; Teresa ia confundir-se com o rebanho das que serviram.»
François Mauriac em Teresa Desqueyroux (tradução de Nataniel Costa, Edição Diário de Notícias)
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