«Com razão ou sem ela,
sempre vivi para escrever. Quase desde a infância, a literatura foi para
mim o filtro da experiência (…) A expectativa do livro refina e
fortalece os dados da vida vivida. Talvez nada disto seja assim e, na
realidade, seja ao contrário: é a imaginação literária que determina,
provoca, as restantes situações «reais» da minha vida. Mas se é assim,
eu não dou conta. Gostaria de ter consciência de que para mim a
realidade não é um facto simples nem pode ser definida por uma única das
suas dimensões. Há pessoas para quem a realidade é apenas o mundo
objectivo, concreto: uma cadeira é uma cadeira, a montanha sempre ali
esteve, a nuvem passa mas obedece às leis da física: tudo isto é real.
Para outras pessoas não há realidade senão a interior, a realidade
subjectiva. A mente é uma vasta sala vazia que se vai enchendo pouco a
pouco, enquanto vivemos, com o mobiliário das percepções. O mundo
objectivo existe, mas não tem sentido se não passar pelo crivo da mente.
A subjectividade confere realidade a um mundo de objectos mudos, sem
vida. Mas há uma terceira dimensão que é onde a minha individualidade
entra em contacto com os outros, com a minha sociedade, com a minha
cultura. Isto é, existe algo que não é nem paradoxo nem impossibilidade,
e que se chama a individualidade colectiva. É nela que me sinto mais
realizado, mais satisfeito, mais em consonância com o mundo. (…)
Portanto, para mim, a realidade é uma estrela de três pontas: a matéria,
a psique e a cultura. A realidade material, a realidade subjectiva e a
realidade do encontro do meu eu com o mundo. Não gosto de sacrificar
nenhuma delas. Só quando as três estão presentes, posso dizer que sou
feliz.»
Carlos Fuentes em Diana ou a Caçadora Solitária (tradução de Maria do Carmo Abreu, Editora Planeta DeAgostini)
Carlos Fuentes em Diana ou a Caçadora Solitária (tradução de Maria do Carmo Abreu, Editora Planeta DeAgostini)
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